NOTA TÉCNICA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA SOBRE EPIDEMIA DO NOVO CORONAVÍRUS (2019-NCOV)
Cientes da preocupação de pacientes e classe médica que estão recebendo consultas em relação ao novo coronavírus (2019 n-CoV), sobre o risco para a saúde de seus pacientes, e, diante da necessidade de orientações para o enfrentamento deste momento epidemiológico em particular, a Comissão de Doenças Endêmicas e Infecciosas da Sociedade Brasileira de Reumatologia posicionase e referencia algumas recomendações para os reumatologistas, além de orientações considerando às particularidades relacionadas ao tratamento dos nossos pacientes.
Aos pacientes, nossa recomendação é que busquem informações com os médicos e profissionais de saúde que acompanham seu caso.
Infecções por patógenos emergentes e reemergentes, como as que estamos vivenciando com o novo Coronavírus (2019-nCoV), são um grande desafio de saúde publica, e costumam ocorrer de forma cíclica, com intervalos de anos. Os coronavírus são vírus RNA envelopados, distribuídos amplamente entre humanos, outros mamíferos e pássaros, e que causam sintomas respiratórios, gastrointestinais e neurológicos. Seis espécies de coronavirus são conhecidos como causadores de doença em humanos. Quatro deles – 229E, OC43, NL63,e HKU1 — causam sintomas de uma gripe comum em indivíduos imunocompetentes. As duas outras cepas – Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus (SARS-CoV) e Middle East Respiratory Syndrome Coronavirus (MERS-CoV) — são de origem zoonótica e foram relacionadas à doença fatal em alguns casos.
O SARS-CoV foi o agente causador de uma epidemia de síndrome respiratória aguda grave em 2002 e 2003, na Província de Guangdong, China. O MERS-CoV foi o patógeno responsável pela epidemia de doença respiratória aguda grave em 2012, no Oriente Médio. Tendo em vista a alta prevalência, ampla distribuição, grande diversidade genética e frequente recombinação em seus genomas, novos coronavírus podem emergir periodicamente em humanos, levando a novas epidemias.
Os sintomas relatados, associados à infecção pelo 2019-nCoV, são na sua maioria os mesmos de uma gripe comum, porém, pode levar a um quadro agudo de doença respiratória grave, com consequente insuficiência respiratória, podendo evoluir para o óbito, de forma semelhante ao que foi descrito nas duas epidemias anteriores, ocorrendo com maior frequência em homens, acima de 70 anos, em indivíduos imunocompetentes.
Entretanto, existe a necessidade de ressaltar algumas peculiaridades a respeito da infecção pelo novo coronavirus na população de pacientes reumatológicos, que pode apresentar susceptibilidade aumentada de adquirir a infecção a depender do grau de imunossupressão, variando de acordo com à própria doença de base e/ou conferida pelo tratamento medicamentoso.
Orientações uso de corticosteroides, imunossupressores e imunobiológicos diante da possível epidemia do novo coronavírus (2019-nCoV)
Não existem, até o momento, estudos publicados sobre a infecção pelo 2019-nCoV em pacientes em uso de corticosteroides, imunossupressores ou imunobiológicos. No entanto, esse grupo de pacientes pode apresentar um quadro clínico mais grave, assim como ocorre em qualquer outro quadro i infeccioso.
Pacientes em uso crônico de corticosteroides sistêmicos são os que apresentam maior risco de infecção, principalmente em doses acima de 20 mg/dia. Além disso, o uso de altas doses de hidrocortisona durante a fase aguda da SARS de etiologia viral, na epidemia de 2003, foi associado a uma maior carga viral de SARS-CoV plasmática, com atraso do clearence viral, risco de outras infecções associadas e aumento da mortalidade. Um outro estudo, na epidemia MERS-CoV demonstrou que o uso de corticosteroide foi associado com maior mortalidade, com um odds ratio de 4,95. T
Também deve ser levado em consideração como sendo de potencial risco aumentado os pacientes em uso de metotrexate, leflunomida, ciclofosfamida e outros imunossupressores, além dos novos medicamentos alvo específico (anti-JAK) que podem também induzir resposta viral prejudicada, além dos imunobiológicos em geral.
Apesar do reconhecido aumento do risco de infecção de uma maneira geral com o uso dos imunobiológicos, alguns estudos sugerem que o uso de inibidores de TNF (anti-TNF) poderiam ser uma possibilidade terapêutica em pacientes com SARS, tendo em vista que nestes casos ocorre a liberação de uma grande quantidade de TNF a partir de macrófagos alveolares. O uso do anti-TNF levaria a uma inibição da ativação imune mediada por anti-TNF, com consequente redução da lesão pulmonar nesses pacientes. Os estudos sobre esse tema apresentam resultados discordantes, ainda não havendo um consenso sobre o uso ou não destes medicamentos na prática clínica.
Antimaláricos (Fosfato de cloroquina e Hidroxicloroquina) no contexto da infecção pelo coronavírus Considerando-se estudos prévios que demonstraram atividade inflamatória e anti-viral do fosfato de cloroquina, diversos ensaios clínicos multicêntricos estão sendo conduzidos na China com o objetivo de avaliar a eficácia e segurança da cloroquina ou hidroxicloroquina em relação a pneumonia associada ao COVID-19 [1].
Estudo “in vitro” mostrou adequado desempenho do fosfato de cloroquina na inibição da infecção pelo COVID-19 [2]. O mecanismo antiviral está relacionado com o aumento do pH requerido para a fusão viral e interfere com a glicosilação dos receptores celulares do vírus [3]. No estudo chinês com mais de 100 pacientes, os resultados preliminares mostraram que o fosfato de cloroquina é superior ao tratamento controle na inibição da exacerbação da pneumonia, na melhora das alterações das imagens, ao promover a negativação do vírus e na capacidade de reduzir a duração da doença [4]. Portanto, até o momento, o fosfato de cloroquina tem mostrado eficácia e segurança em relação a pneumonia associada ao COVID-D19. As análises posteriores dos dados dos ensaios clínicos provavelmente irão definir os subgrupos que irão se beneficiar com o tratamento com cloroquina. Um grupo de médicos coreanos especialistas que tratam os pacientes confirmados em todo o país organizaram um “task force” (grupo de colaboração multicêntrico do departamento de saúde de Guangdong-korea) para estabelecer um consenso sobre a indicação de tratamento com antivirais e antimaláricos, onde as principais diretrizes são seguintes (5):
Se os pacientes são jovens, saudáveis e apresentam sintomas leves, sem condições subjacentes, os médicos podem observá-los sem tratamento antiviral. No entanto, se os pacientes são idosos ou têm condições subjacentes com sintomas graves, deve-se considerar um tratamento antiviral e este deve iniciar a o mais rápido possível.
Para o tratamento antiviral, os médicos recomendaram lopinavir 400 mg / ritonavir 100 mg ou cloroquina 500 mg VO/dia. Como a cloroquina não está disponível na Coréia, os médicos podem considerar a hidroxicloroquina 400 mg VO/dia. Não há evidências de que o uso de lopinavir / ritonavir com cloroquina seja mais eficaz que as monoterapias e podem cursar com efeitos colaterais indesejáveis.
Vale ressaltar, que estamos trazendo aqui para conhecimento de todos, os esforços que têm sido desenvolvidos na tentativa de conter a disseminação e evitar complicações da infecção, relatados e publicados pelos profissionais que estão lidando diretamente com a situação, porem, entendemos que que ainda necessitam de maiores investigações e constante atualização sobre assunto, não sendo esta uma recomendação da SBR e a indicação destes tratamentos ficam sob responsabilidade do medico generalista ou infectologista que, por ventura, estiver atendendo um caso confirmado.
Pacientes reumáticos com suspeita de infecção pelo COVID-19
Levando-se em consideração que pacientes com doença reumatológica em uso de medicamentos que modificam a resposta imune, como corticosteroides, DMARD sintéticos, alvos específicos e biológicos, estão mais susceptíveis à infecção e a desenvolver quadros com maior gravidade do que uma pessoa imunocompetente, até que novas evidências estejam disponíveis, recomenda-se seguir
as orientações gerais (desde a definição de caso, diagnóstico e manejo do quadro agudo e suas complicações) já emitidas pelos órgãos oficiais listadas abaixo, resumidamente:
- Encaminhar imediatamente qualquer suspeita clínica (quadro gripal + viagem pessoal ou contato com pessoa que veio de país onde existe epidemia confirmada) para avaliação clínica e exames complementares (laboratório e tomografia de tórax) – definição do caso
- Avaliar individualmente, caso a caso, sobre a necessidade de interromper o uso dos medicamentos imunossupressores ou imunobiológicos diante a suspeita de infecção pelo 2019-nCov, considerando segundo grau de imunossupressão conferido e atividade da doença
- Se em uso de corticosteroide cronicamente, manter na menor dose possível
- Evitar viagens para os locais onde existem epidemias confirmadas- consulte seu médico
- Utilizar as recomendações para evitar a contaminação – lavar sempre as mãos, evitar colocar a mão no próprio rosto ou das pessoas, etc Fontes de Referência: Ministério da Saúde: https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2020/fevereiro/05/Protocolo-de-manejo-clinico-parao- novo-coronavirus-2019-ncov.pdf https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2020/fevereiro/21/2020-02-21- BoletimEpidemiologico03.pdf OMS/PAHO (OPAS) https://www.who.int/news-room/q-a-detail/q-a-coronaviruses https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:folha- informativanovo-coronavirus-2019-ncov&Itemid=875 CDC https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/about/prevention-treatment.html SBI https://www.infectologia.org.br/admin/zcloud/125/2020/02/a7ef2975d6d935909e4ed343b5daeeb3f6bd fae52f5add46d78e0193d610b46f.pdf Referências Bibliográficas
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